Criar ações para vender um apartamento no Twitter, convidar o piloto Rubens Barrichello para inaugurar um blog institucional ou antecipar vídeos de campanhas publicitárias no YouTube. Essas são algumas das tarefas dos profissionais da nova mídia que começam a povoar as corporações. Empresas como Tecnisa, LG Electronics, O Boticário e Totvs já recrutaram executivos para adequar estratégias de marketing tradicionais às redes sociais e ferramentas on-line.
Segundo a Resch Recursos Humanos, a demanda pela função começou a crescer há cerca de dois anos. A maior parte dos executivos contratados tem formação em comunicação e marketing, além de experiência anterior em sites e agências de produção on-line. Alguns estão sendo recrutados até em salas de aula, durante os cursos de MBA em marketing.
Dentro das empresas, o profissional da nova mídia comanda equipes enxutas e, no geral, responde à gerência de marketing. Ele precisa ter disposição para passar até 12 horas seguidas diante do computador e ser curioso para garimpar novidades na web. Além disso, deve ser bem articulado para convencer a empresa sobre a importância das campanhas digitais. Entre suas atribuições está também fazer a intermediação entre a companhia e as agências terceirizadas que desenvolvem projetos on-line sob encomenda. “Os profissionais de nova mídia estão sendo contratados principalmente pelos setores de serviços e de bens de consumo”, afirma Margot Nick, gerente de projetos da consultoria Kienbaum, especializada na seleção e recrutamento de executivos.
Segundo a sócia da Resch Recursos Humanos, Jacqueline Resch, as mídias sociais também criaram oportunidades para profissionais de TI, que desenvolvem promoções com as novas tecnologias, e para especialistas em marketing e comunicação, que utilizam a novidade para planejar ações de atração, retenção de clientes e reconhecimento de marca. “A demanda por esses executivos começou com o interesse das companhias em usar a nova mídia como ferramenta de marketing e endomarketing.”
Este ano, a Resch recrutou dois profissionais seniores para funções de coordenação com expertise em novas mídias. “Apesar de grande parte dos projetos do segmento ainda se concentrar em agências de mídia on-line terceirizadas, as empresas que contratam esse serviço começam a exigir dos funcionários um maior conhecimento da área”, justifica Jacqueline. “Com a tendência das corporações em conhecer melhor o seu público e monitorar a reação dos consumidores, a procura por essas competências deve aumentar.”
Na Tecnisa, empresa do setor imobiliário com receita de R$ 514,1 milhões, a estratégia digital começou a partir de 2001 com o objetivo de divulgar a marca do grupo. Nos últimos oito anos, a companhia incorporou todas as novidades da web: está presente em blogs e redes sociais como Orkut, Facebook, LinkedIn, MySpace e SlideShare. “No Twitter, temos mais de 3 mil seguidores e já postamos mais de 100 vídeos no YouTube”, detalha Roberto Aloureiro, gerente de mídia social, responsável pelas operações.
Aloureiro está na empresa desde o ano passado e foi contratado por conta de seu desempenho em um curso de MBA. “Ele se sobressaiu diante dos outros alunos”, lembra Romeo Busarello, diretor de marketing da Tecnisa e professor da ESPM. “Para exercer a função é necessário ser um profissional ‘plugado’, ter boa articulação escrita e verbal, além de muita curiosidade para buscar novidades.”
Graduado em propaganda e marketing, Aloreiro trabalhou em agências on-line nas áreas de planejamento, atendimento e design. Hoje, cuida das estratégias da Tecnisa nas redes sociais, além de elaborar conteúdos, responder a blogs e monitorar as opiniões dos internautas sobre a empresa. No ano passado, criou o perfil da construtora no Twitter e disparou uma série de ações para aumentar o número de seguidores, com o envio regular de informações sobre o mercado imobiliário e lançamentos.
Graças a uma promoção para os seguidores da ferramenta, a companhia realizou a primeira venda com a ajuda do Twitter: um apartamento em São Paulo, avaliado em R$ 500 mil. “O trabalho é terceirizado. Eu coordeno cinco fornecedores na produção de conteúdo, fotos, vídeos e design”. No próximo ano, a incorporadora deve abrir mais uma vaga para analista de redes sociais.
“O especialista em novas mídias precisa dominar a aplicabilidade das novas ferramentas”, diz a consultora Jacqueline Resch. “Ao mesmo tempo, deve conhecer muito bem a empresa onde trabalha para representá-la adequadamente nas redes sociais.”
Na Totvs, do setor de tecnologia, a jornalista Carla Lavina é coordenadora de comunicação e novas ferramentas de mídia desde 2008. Assim como Aloureiro, da Tecnisa, também foi recrutada em um curso de MBA em marketing. “O gerente de comunicação da empresa estava na mesma turma”, lembra.
Além do novo site da companhia, que inclui uma “central de oportunidades” que capta novos clientes, a área lançou um blog onde altos executivos da organização propõem discussões sobre gestão e tecnologia. “Iniciamos também um canal no Twitter, com novidades da empresa e notícias para os parceiros”. As campanhas publicitárias da Totvs também são divulgadas no YouTube e em comunidades como a Drimio, especializada em marcas.
Até janeiro de 2010, Carla entrega uma nova intranet que vai unificar o banco de dados da companhia e servir como um de canal de comunicação para os funcionários da Totvs. A executiva trabalha com uma analista de negócios e duas agências on-line. “Como atuo em uma empresa de TI, tive que me especializar rapidamente para trabalhar os recursos digitais de forma estratégica e atingir diversos públicos”, afirma. “Depois do MBA em marketing, fiz uma especialização em marketing digital”, diz.
Quem também precisou correr para não perder o bonde das novas mídias foi a executiva Claudia Callais, gerente de responsabilidade social da Fundação Bunge. Ela coordena as iniciativas on-line da entidade, criada há 54 anos. “Eu nunca tinha entrado no Orkut, mas tive de conhecer a ferramenta melhor para usá-la a nosso favor”, confessa. Hoje, a Fundação tem um novo portal, com navegação em três idiomas, vídeos no YouTube e recentemente ingressou no Twitter. “Começamos com 88 seguidores na primeira semana e passamos para 116 na segunda.”
Para quem precisa começar do zero na função, Cláudia dá as dicas: não ter preconceitos com as novas ferramentas de mídia, buscar conhecimento sobre o assunto e definir a melhor forma de utilizá-las. Para ajudá-la na empreitada, a gerente, que comanda 11 pessoas, contratou há cinco anos uma empresa de projetos on-line. “Hoje, 15% do meu tempo é dedicado ao acompanhamento das operações digitais”, afirma.
Segundo Margot Nick, gerente da consultoria Kienbaum, além de conhecimento técnico em TI e foco em resultados, o profissional que lida com a nova mídia deve demonstrar facilidade de aprendizagem, agilidade e criatividade. “Muitas empresas ainda contratam o serviço de terceiros para a implementação das ferramentas e só depois preparam os profissionais internos para administrá-las.”
Na LG Electronics, a gerente de marketing digital Cristiana Agostini está no posto há apenas cinco meses. “A área foi instituída com a gerência de branding em julho de 2008. Mas, devido ao crescimento dos negócios, tornou-se uma gerência independente em junho deste ano”, explica Eduardo Toni, diretor de marketing da LG, que contratou a profissional pela experiência na área de marketing on-line. “Pretendemos expandir a unidade em breve, conforme a demanda”, diz.
Antes de ser recrutada pela LG, Cristiana era gerente de marketing de produto para a América Latina do Yahoo!. Formada em letras e publicidade, fica, em média, 12 horas on-line por dia e chefia uma equipe de cinco pessoas- também usa duas agências terceirizadas. “Uma das minhas funções é mapear oportunidades e parcerias estratégicas para trabalhar a marca no meio digital”, diz.
A LG tem um site corporativo, além de ações no YouTube, Twitter e um blog institucional inaugurado há dois meses com a participação do piloto Rubens Barrichello. “Todos esses canais dão suporte para campanhas de lançamento de produtos e ajudam a fazer um trabalho de comunicação institucional e de relacionamento com os consumidores.”
Diferentemente de outras áreas, a executiva acredita que os resultados de projetos que envolvem a nova mídia podem ser definidos no início do planejamento e são mais fáceis de serem mensurados- basta contar o número de visitas aos sites ou a quantidade de “twitts” e seguidores. “Além disso, uma boa pesquisa com os internautas indica se o trabalho está alcançando seus objetivos”. diz.
A Universidade Cruzeiro do Sul, com 35 mil alunos e campi em três cidades, também acaba de contratar um especialista em mídia on-line. A vaga foi criada e preenchida em maio, via headhunter. “Os meios convencionais já não davam conta da comunicação com os alunos e essa área está se tornando cada vez mais importante, principalmente em organizações voltadas ao público jovem, como as instituições de ensino superior”, justifica Fábio Figueiredo, diretor de desenvolvimento do grupo Cruzeiro do Sul Educacional. “Os resultados esperados não são diferentes das metas de outros executivos de comunicação. Queremos geração de demanda, satisfação do cliente e mais relacionamento com a marca.”
Para Fernando Dutra, gerente nacional de serviços de marketing do O Boticário, o executivo que lida com a nova mídia precisa ter habilidades de negociação para convencer a empresa da importância das campanhas digitais. “É preciso fazer um trabalho de convencimento entre outras gerências porque tudo o que é novo não é aceito logo no primeiro momento”. Segundo Dutra, a companhia pode aumentar o número de postos na área, a partir de 2010.
“Precisamos detectar as oportunidades que a internet oferece e propor ações para a companhia”, explica Elienai Allebrandt, analista de marketing web do Boticário, que integra o time de cinco pessoas responsável pelos projetos digitais da marca. Em um ano, a equipe mais do que dobrou. Na empresa desde abril de 2008, ela trabalhou como gerente de projetos em uma agência on-line antes de assumir a função.
Segundo Luana Pontes, diretora da Cherry Plus, agência de criação de estratégias on-line para Gillette e Webjet, o especialista em novas mídias das empresas deve saber que a comunicação de uma marca nas redes sociais tem uma dinâmica diferente das plataformas tradicionais. “Para entender esse ambiente, o profissional deve acompanhar a evolução de todas as ferramentas e as peculiaridades das comunidades on-line.”
Outra característica importante observada por quem acompanha esses profissionais no dia a dia é a habilidade para gerenciar fatos negativos que aparecem na rede, como reclamações sobre produtos ou boatos em redes sociais. “A crise na web é imediata e também deve ser tratada com rapidez”, afirma Simone Freire, sócia da Espiral Interativa, que trabalha para a Fundação Roberto Marinho e Alcatel-Lucent. “Em pouco tempo, a nova mídia estará velha. Por isso, devemos estar sempre atentos e reciclar as ideias”, diz Aloureiro, gerente de mídia social da Tecnisa.
Fonte: Valor Econômico